sexta-feira, 3 de outubro de 2014

O Estado é a maneira errada de fazer as coisas

 
 
Em quem você vai votar? Chegados os tempos de eleição, nos esforçamos para organizar os nossos pensamentos para explicar os motivos dessa pergunta não nos fazer o menor sentido. O nosso objetivo é simples de ser entendido, porém difícil de ser realizado. Queremos demonstrar que o Estado é a maneira errada de fazer as coisas. Para isso falaremos muito – mas não o suficiente – e, em alguns momentos, de forma um pouco chata. Se serve de desculpa, esse foi o único caminho que encontramos.
É recorrente na história que se pense que o mundo vivido é o único possível. Essa é uma noção que tem muita força atualmente: muitos sustentam não haver a possibilidade de uma transformação radical da sociedade. Claro que nos opomos a isso. Ao contrário do que ocorre com aqueles que se esforçam para legitimar as dominações, queremos refletir criticamente sobre o Estado, perceber os aspectos negativos dessa forma de nos organizarmos para que assim possamos encontrar outras realidades. Em um mundo em que as relações de opressões aparecem como naturais e eternas, a crítica coloca em movimento, estimula. Nessa disputa por uma concepção de sociedade mais livre, é central ver através da história que as formas como nos constituímos carregam certo grau de arbitrariedade. Ou seja, conhecemos suficientes maneiras de nos organizarmos para saber que nenhuma é a única possível. Podem nos chamar de ignorantes ou de ingênuos, mas esperamos sim que o(s) mundo(s) seja(m) diferente(s). Aqui negação e esperança se completam em uma dança que busca sair dos limites do tablado.
 
O que é o Estado?
O nosso ponto de partida é o poder. De forma resumida é possível afirmar que a unidade básica do Estado é o poder político, ou seja, a capacidade de impor coercitivamente a vontade de umas pessoas sobre a de outras. O que fundamenta o Estado é a possibilidade de uns exercerem um poder-sobre outros. É muito claro que esse poder coercitivo não faz parte da “natureza humana” pelo simples motivo de que existiram muitas sociedades que se recusaram a se organizar assim. Não sendo natural que isso ocorra, ele só pode ser entendido através das suas ocorrências. O Estado é, portanto, uma forma histórica de organização social – dentre as muitas possíveis.
 
Porém, o poder coercitivo não ocorre somente no Estado, portanto, precisamos de algo mais para nos referir a esse grande monstro. Não é possível igualar os dois conceitos. Para falarmos do Estado, propriamente dito, é necessário que estejamos nos deparando com estruturas específicas. A característica principal do Estado é ser uma instância separada da coletividade e o fato de ser instituído com o intuito de assegurar constantemente essa separação. A forma que assume ao realizar isso é uma estrutura burocrática e hierárquica. Como nos faz lembrar o termo burocracia, ele tende a suprimir aquilo que é proclamado como seus objetivos, ou seja, possui uma inércia e uma lógica própria que dominam as finalidades para as quais elas deveriam servir. As evidências se invertem: o que podia ser visto como um conjunto de instituições a serviço da sociedade, transforma-se numa sociedade a serviço das instituições. A polícia com seus cassetetes que gritam “ordem!” independente do quão justo é um protesto, é uma boa imagem para essa deturpação. Nesse esforço de auto-manutenção, é fundamental que seja respeitada uma estrutura de mando e de obediência que fica clara na diferença que tem entre o presidente e a faxineira servidora pública.
 
Nos perdoem por ainda estarmos trabalhando em termos bastante abstratos. Uma aproximação com uma teoria crítica do Estado contextualizada historicamente é possível de ser feita olhando para a relação necessária dele com o capitalismo. O Estado exerce no capitalismo o papel de garantidor da dominação de classe ao servir como agente coercitivo de manutenção do trabalho assalariado. Essa é uma longa discussão, mas, tentando tornar mais simples o complexo, podemos dizer que no capitalismo a propriedade privada é central porque possibilita a dominação daqueles que não possuem os meios de fazer as coisas. O trabalhador que não possui os meios de produzir é dominado de forma não pessoal, já que como não possui a propriedade tem que se submeter ao trabalho assalariado. A garantia dessa propriedade não é exercida pelo dominador, mas é cedida ao Estado. Focando essa explicação no que mais nos interessa, é possível afirmar que a existência do Estado como uma instância separada da sociedade depende das relações capitalistas e serve para mantê-la. Para tanto o Estado deixa sempre presente a ameaça de recorrer à violência para que a reprodução do capitalismo ocorra. Somente a ele cabe a violência legítima e essa é uma ameaça que paira sobre todos aqueles que questionam as relações de dominação.
 
E onde ficamos nós nessa abstração toda? Nos cabe o papel de cidadãos – mais uma abstração. Nossas particularidades, nossos jeitos, nossos cheiros são esquecidos para que o Estado consiga nos controlar com suas políticas públicas. Para eles somos números que ganham características mais definidas se tivermos dinheiro e boas relações. Um juiz não olha do mesmo jeito para o negro e para o filho do seu amigo do golfe. Para nós cabe somente o papel de votar a cada quatro anos, porque qualquer tentativa de tornar a política cotidiana pode ser considerada perigosa. Votamos e escolhemos “representantes”. Mesmo que eles quisessem não conseguiriam nos representar, pois não existe essa massa indefinida chamada “eleitores”. Existem pessoas díspares e mutáveis que ao escolher um candidato nunca poderão saber como ele irá atuar nos próximos quatro anos em questões tão variadas quanto as que um governante manda. Ou seja, a eleição é mais uma mentira para nos dar a impressão de que temos alguma escolha em um mundo baseado justamente no controle das nossas vontades.
 
Em busca da autonomia
Nessa configuração tão complexa o Estado se separa do social virando uma instituição que tenta monopolizar o político. Só se fala de política nas eleições e nós nos negamos a isso. Defendemos a autonomia, ou seja, que as pessoas se envolvam diretamente na organização das suas vidas cotidianas. Isso como indivíduos e como coletividades. A pessoa se forma no seu estar no mundo e nas suas interações, portanto nunca deve ser pensado isoladamente. Aqui inserimos a dimensão social da autonomia. Para a sua realização em um mundo instituído de forma a fortalecer as dominações como o nosso é importante ressaltar a capacidade instituinte das ações coletivas. As coletividades conseguem sim mudar a realidade. Detrás do que aí está e parece tão sólido, existe sempre o pulsar criativo.
É nessa potencia criadora que nos confiamos ao pensar como transformar o mundo. O que fazer para mudar o mundo? Rompê-lo de tantas formas quanto pudermos e tentar expandir e multiplicar as fissuras e promover a sua confluência; assim nos disseram e nos parece fazer sentido. Um milhão de picadas de abelhas. A emancipação depende da recusa, do desobedecer. Porém não estamos apenas nos distanciando das estruturas de poder, estamos criando novas práticas cotidianas. O Não deve ser seguido por um outro-fazer, uma outra atividade que nos torne ativos.
 
A construção dessas fissuras nega a ideia de pureza, ou seja, elas estão permeadas por contradições. A noção de autonomia muitas vezes defende uma externalidade radical para com o Estado e o capitalismo, porém isso é problemático por não dar conta das complexidades da nossa realidade. Cria-se dessa forma uma dicotomia entre autonomia e institucionalização que se baseia em estados ideais impossíveis de serem estabelecidos. A simples marginalização não é suficiente para mudar o mundo porque pode servir de alguma forma para as estruturas opressivas. Além disso, muitas vezes as fissuras são atividades em tempo parcial que são intercaladas com a dura necessidade de vender a força de trabalho para garantir a sobrevivência. Paradoxo? Infelizmente a vida está cheia deles. Porém, isso não significa se curvar, pois mesmo quando seja lunático continuaremos exigindo o impossível.
 
Sabemos que o contato com o Estado nos faz adotar certos modos de relações sociais que reforçam as características opressivas elencadas acima. As leis fazem parte da coesão social capitalista e de sua racionalidade, portanto, invariavelmente seremos considerados criminosos. Isso não nos paralisa e nem tampouco faz com que buscamos sempre realizar ações ilegais, pois sabemos que acima de tudo essa é uma questão de escolha tática.
Como já deve estar claro não se trata de conquistar o Estado nem com armas nem com votos. Não vamos cometer o mesmo erro de achar que o Estado pode ser um instrumento neutro para facilitar as transformações. Ele é a maneira errada de fazer as coisas e a boa vontade nunca conseguirá superar isso. A instrução na conquista do poder inevitavelmente se converte em uma instrução no próprio poder. Vemos cotidianamente os partidos e candidatos mais bem intencionados fazerem concessões absurdas para garantir o sucesso próprio. Esse é um caminho de difícil retorno. A centralidade do Estado na transformação faz com que se reforce cada vez mais a soberania do Estado. Um dos motivos que justifica essa defesa é que existe um grande peso das estruturas e das formas de comportamento herdadas. Outros fatores que podemos apontar são a separação dos funcionários estatais que tendem a se manter assim e as pressões para assegurar a economia – que geralmente não é considerada como deveria, ou seja, como um sistema de exploração. Não nos interessam os partidos políticos, pois a transformação através dos olhos do Estado ou de uma organização centrada no Estado só pode ser feita em nome de outros, para o “benefício das pessoas”, não uma transformação feita pelas próprias pessoas. 
 
Porém isso é uma relação em que alguns mandam e outros obedecem – justamente do que queremos nos afastar – porque agir em benefício de alguém envolve invariavelmente um grau de repressão da autonomia desses sujeitos.
Se trata, portanto, de uma transformação da vida cotidiana em um caminho que não terá fim, mas que se esforçará sempre por terminar as opressões. Essa é a única maneira de manter em uso o conceito de revolução, pois os que se centram no Estado demonstraram quão facilmente a ditadura pode esquecer do proletariado. No lugar de um grande acontecimento, pensamos em um longo processo. Ela é, portanto, uma revolução não-instrumental, não é um meio para chegar a um fim, já que todo o caminho é igualmente importante. Essa é também uma transformação sem certezas, pois não existe nada no mundo que garanta seu triunfo, ela depende de um eterno esforço dos seus sujeitos. Isso implica em uma constante auto-crítica para garantir que o caminho que está sendo construído leve realmente para mais perto da autonomia.
Terminamos agradecendo a todos aqueles que já disseram e vivenciaram antes de nós as mesmas coisas: os autonomistas, os anarquistas e, principalmente, os sem identidades de todas as partes do mundo.
 
E a pergunta que fica depois disso tudo é: por que continuar se contentando em votar no menos pior?
 
AA (Autônomos Anônimos)

quarta-feira, 16 de julho de 2014

Protesto ANTI-BRICS



Desde 2009 os países emergentes se reúnem à criação de um bloco econômico em contraposição ao bloco estadosunidense NAFTA, OMC e outros. Os países emergentes têm em comum dívidas com os bancos internacionais BID e FMI e os altos juros cobrados que inviabilizam o avanço em infraestrutura nesses países. É um dos principais motes para criação desse bloco econômico dos países emergentes, inclusive a questão beligerante que é utilizada como pano de fundo. Brasil e Rússia assinaram em Julho de 2014 um tratado de segurança nuclear que indica claramente a retomada da corrida armamentista global. Para fomentar e viabilizar esse bloco econômico dos países emergentes, BRICS, foi criado no encontro em Fortaleza, em julho de 2014, o Banco Internacional BRICS (BIB).

Toda essa articulação internacional dos representantes dos países emergentes, criadores do BRICS, jamais consultaram a população desses países, sobre aprovação do BRICS. Mesmo assim, bilhares de dólares serão depositados nesse novo banco advindo dos fundos dos impostos da população pobre desses países. É incomensurável a desassistência dos governos do BRICS em seus países sede à população pobre. Todos esses países tem em comum a precariedade em infra-estruturas básicas nas comunidades periféricas de trabalhadores resultante da corrupção em larga escala. Ainda, é flagrante na Rússia, China e Índia a negligência de direitos humanos à etnias que há décadas lutam por independência nesses países. São exemplos contemporâneos dessa tragédia humana a Chechênia, Tibet e Caxemira onde milhares de inocentes morrem em bombardeios realizados por esses governos.

Não é possível que a nação brasileira assista e apoie o massacre de crianças, mulheres e velhos inocentes sem que nada seja feito.

A iniciativa do Grupo de Autonomia Popular - GAP – é trazer para o centro do debate as questões relacionadas às demandas nacionais exigidas pela população nas jornadas de Junho de 2013. Naquela ocasião um grito uníssono da população nas ruas pela Tarifa Zero foi ouvido pelo país inteiro, mas passado mais de um ano e nada foi executado nessa direção até agora.
Mesmo assim, o governo ao invés de atender ao clamor das ruas desviou bilhões do BNDS para criação do fundo de reserva do BIB sem que houvesse qualquer consulta pública ou diálogo com a população. Dessa maneira despótica o BRICS tem se concretizado verticalmente nos países emergentes, calam as vozes que buscam debater não a guerra, não tensionamento internacional, não envio de dinheiro público à iniciativa privada internacional, mas, a criação de educação, saúde, moradia, lazer, transporte público de qualidade sem sobretaxamento.

Na semana de 14 a 18 de Julho de 2014, o G.A.P. organizou uma série de eventos para colocar na agenda da militância popular o debate do BRICS e a realização da reunião desse bloco em Fortaleza sem debate com a população.

Fique por dentro e ajude a construir a resistência militante contra a fuga de dinheiro do povo para iniciativa privada internacional.

Avante aos que lutam!!!

Pelo direito de ir e vir, pelo direito à cidade. Contra BRICS existir, e impor seu apartheid


terça-feira, 6 de maio de 2014

Sufrágio feminino – Voto Feminino



O movimento pelo Sufrágio femininoVoto Feminino é um movimento social, político e econômico de reforma, com o objetivo de estender o sufrágio (o direito de votar) às mulheres. Participam do sufrágio feminino, mulheres ou homens, denominados sufragistas.
Em 1893, a Nova Zelândia se tornou o primeiro país a garantir o sufrágio feminino, graças ao movimento liderado por Kate Sheppard.

Mitologia
Segundo Marco Terêncio Varrão, citado por Agostinho de Hipona, as mulheres da Ática tinham o direito ao voto na época do rei Cécrope I. Quando este rei fundou uma cidade, nela brotaram uma oliveira e uma fonte de água. O rei perguntou ao oráculo de Delfos o que isso queria dizer, e resposta é que a oliveira significava Minerva e a fonte de água Netuno, e que os cidadãos deveriam escolher entre os dois qual seria o nome da cidade. Todos os cidadãos foram convocados a votar, homens e mulheres; os homens votaram em Netuno, as mulheres em Minerva, e Minerva (em grego, Atena) venceu por um voto. Netuno ficou irritado, e atacou a cidade com as ondas. Para apaziguar o deus (que Agostinho chama de demônio), as mulheres de Atenas aceitaram três castigos: que elas perderiam o direito ao voto, que nenhum filho teria o nome da mãe e que ninguém as chamaria de atenienses.
Leia tbm sobre o Sufrágio Universal

Histórico
Em que pese o fato de as primeiras feministas terem encontrado nos ideais democráticos de inspiração iluminista – igualdade e liberdade, representados mais diretamente pelo direito à participação na vida política e por leis que promovam uma justiça mais equânime – o campo propício para suas reivindicações, o cerne das referências filosóficas que embasam os ideais democráticos – representadas por pensadores como John Locke, Jean-Jacques Rousseau e Jeremy Bentham – estava já impregnado de conceitos que excluíam a mulher de uma participação mais ativa na condução da sociedade. Um forte exemplo disso é o direito ao voto, que já na Grécia Antiga, em pleno nascedouro da democracia ateniense, era vetado para as mulheres.

A luta pelo voto feminino foi sempre o primeiro passo a ser alcançado no horizonte das feministas da era pós-Revolução Industrial. As “suffragettes” (em português, sufragistas), primeiras ativistas do feminismo no século XIX, eram assim conhecidas justamente por terem iniciado um movimento no Reino Unido a favor da concessão, às mulheres, do direito ao voto. O seu início deu-se em 1897, com a fundação da União Nacional pelo Sufrágio Feminino por Millicent Fawcett (1847-1929), uma educadora britânica. O movimento das sufragistas, que inicialmente era pacífico, questionava o fato de as mulheres do final daquele século serem consideradas capazes de assumir postos de importância na sociedade inglesa como, por exemplo, o corpo diretivo das escolas e o trabalho de educadoras em geral, mas serem vistas com desconfiança como possíveis eleitoras. As leis do Reino Unido eram, afinal, aplicáveis às mulheres, mas elas não eram consultadas ou convidadas a participar de seu processo de elaboração.

Ainda que obtendo um limitado sucesso em sua empreitada – a conversão de alguns membros do então embrionário Partido Trabalhista Britânico para a causa dos direitos das mulheres é um exemplo -, a maioria dos parlamentares daquele país acreditava, ainda respaldados nas idéias de filósofos britânicos como John Locke e David Hume, que as mulheres eram incapazes de compreender o funcionamento do Parlamento Britânico e, por conseguinte, não podiam tomar parte no processo eleitoral.

O movimento feminino ganhou, então, as ruas e suas ativistas passaram então a ser conhecidas pela sociedade em geral pelo (à época, ofensivo) epíteto de “sufragistas”, sobretudo aquelas vinculadas à União Social e Política das Mulheres (Women’s Social and Political Union – WSPU) movimento que pretendeu revelar o sexismo institucional na sociedade britânica, fundado por Emmeline Pankhurst (1858-1928). Após ser detida repetidas vezes com base na lei “Cat and Mouse”, por infrações triviais, inspirou membros do grupo a fazer greves de fome. Ao serem alimentadas à força e ficarem doentes, chamaram a atenção da opinião pública pela brutalidade do sistema legal na época e também divulgaram a sua causa. Ela foi uma militante que imprimiu um estilo mais enérgico ao movimento, o qual culminou com situações de confronto entre sufragistas e policiais e, finalmente, com a morte de uma manifestante, Emily Wilding Davison (1872-1913), que se atirou à frente do cavalo do rei da Inglaterra no célebre Derby de 1913, tornando-se a primeira mártir do movimento.

Mesmo que tenha causado grande comoção o movimento pelo voto feminino na Inglaterra da década de 1910, as ações de protesto empreendidas pelas sufragistas, contudo, apenas vieram a obter um parcial sucesso com a aprovação do Representation of the People Act de 1918, o qual estabeleceu o voto feminino no Reino Unido – em grande parte, dizem alguns historiadores, motivado pela atuação do movimento das sufragistas na Primeira Guerra Mundial (1914-1918), já que as sufragistas deixaram as ruas e assumiram importante papel nos esforços de guerra.

A lei britânica de 1918 deu forças a mulheres de diversos outros países para que buscassem seus direitos ao voto, que as primeiras feministas consideravam de importância maior que outras questões referentes à situação feminina justamente por acreditarem que, pelo voto, as mulheres seriam capazes de solucionar problemas causados por leis injustas que lhes vetavam o acesso ao trabalho e à propriedade, por exemplo. Habilitando-se ao sufrágio, as mulheres passariam a ser também elegíveis e assim, pensavam as feministas, poderiam concorrer de igual para igual com os homens por cargos eletivos.

Por mais que a opressão sobre as mulheres seja ainda uma cruel realidade, elas têm direito ao voto e à participação política ampla na maioria dos países. Em países como o Kuwait, por exemplo, existem movimentos que reproduzem as mesmas lutas das sufragistas do século XIX, na tentativa de forçar o governo daquele país a mudar sua legislação eleitoral e adotar o voto universal em pleno século XXI.

O voto feminino em Portugal

O sufrágio feminino em Portugal acompanhou, de certa forma, o fenómeno civilizacional do ocidente liberal judaico-cristão. À imagem do que se passava noutros países, o debate em volta do sufrágio feminino passou a fazer parte da agenda política nacional, com mais frequência a partir de 1892, data em que o primeiro país – a Nova Zelândia – deu o primeiro passo nesse sentido. A 28 de Maio de 1911, Carolina Beatriz Ângelo, médica, viúva e “chefe de família”, aproveitando um lapso do legislador, participou nas eleições para a Assembleia Constituinte. A lei em vigor referia que podiam votar os “cidadãos portugueses com mais de 21 anos, que soubessem ler e escrever e fossem chefes de família”. Carolina Beatriz Ângela invocou a sua qualidade de chefe de família alfabetizada, no entanto o pedido foi-lhe negado pelo ministro António José de Almeida. 

Carolina Ângelo interpôs recurso e o juiz João Baptista de Castro, pai de Ana Castro Osório, deferiu a sua pretensão com a seguinte fundamentação: Excluir a mulher (…) só por ser mulher (…) é simplesmente absurdo e iníquo e em oposição com as próprias ideias da democracia e justiça proclamadas pelo partido republicano. (…) Onde a lei não distingue, não pode o julgador distinguir (…) e mando que a reclamante seja incluída no recenseamento eleitoral. Este episódio gerou grande controvérsia na época. Dada a aproximação dos republicanos com o movimento feminista do início do séc. XX2 , Carolina Ângelo terá aproveitado o facto de se tratar das primeiras eleições republicanas para exercer a sua luta política pelo direito de voto das mulheres. No entanto o Governo rapidamente se apressou a clarificar a sua posição nesta matéria, tendo vedado expressamente o voto às mulheres, pela Lei nº 3 de 3 de Julho, do ano de 1913:

São eleitores dos cargos políticos e administrativos todos os cidadãos portugueses do sexo masculino, maiores de 21 anos, ou que completem essa idade até ao termo das operações de recenseamento, que estejam no gozo dos seus direitos civis e políticos, saibam ler e escrever português e residam no território da República Portuguesa.

Porque se teriam oposto os republicanos ao voto por parte da mulher, quando ambos os movimentos políticos (o republicanismo e o feminismo) eram (e são) ideologicamente tão próximos4 ? A explicação desta recusa é encontrada no anticlericalismo que caracterizava o movimento republicano aliado ao estigma da mulher, vista na época como reaccionária, religiosa e influenciável. Havia, neste contexto, claro receio da influência dos padres nas decisões políticas das mulheres, como bem ilustram estes dois recortes dos debates parlamentares:

No dia em que este assunto foi discutido na comissão, tinha eu passado pela igreja de S. Mamede, donde vi sair centenas de senhoras que ali tinham ido entreter os seus ócios e ilustrar o espírito na prática do mês de Maria. O voto concedido a mulheres nestas condições, vivendo sob a influência do clericalismo, seria o predomínio dos padres, dos sacristães, numa palavra, dos reacionários.

Diário do Senado: Legislatura:1; Secção legislativa:; Número:121; Página:18; Data:24/06/1912

Sr Martins Cardoso: (…) Quanto ao outro ponto, que tam debatido tem sido, e que diz respeito ao sufrágio das mulheres, as razoes que eu apresentei tem uma grande forca, porque no nosso país a diferença entre a situação do homem e da mulher é palpável, e, ainda nesta diferença de opiniões, eu pregunto se a mulher assim preparada se pode comparar ao homem? Seria um erro; mais ainda — uma temeridade — senos considerássemos um facto recente dos últimos tempos da monarquia. Sabemos que o culto jesuítico, nos últimos anos, se exercia por tal forma, que constituía um perigo para o país, tendo sido uma das causas principais da queda da monarquia. Esses reaccionários espalhando-se pelas aldeias e vivendo sempre em contacto com a gente do campo, desenvolvia numa acção de que resultava o seguinte: não sendo o povo fanático, o padre no emtanto sugestionava facilmente as mulheres que, tem fundamente radicado o sentimento religioso.Nestas condições pregunto Apodemos nós garantir à mulher o voto? E como se há-de resolver a dificuldade que resulta deste perigo para a República? Seja-me permitido dizer que isto é uma utopia; isso é viver na lua! (Apoiados) (…)

Diário do Senado: Legislatura:1; Secção legislativa:2; Número:130; Página:11; Data:02/07/1912

A I República nunca chega a reconhecer a capacidade electiva às mulheres. Vai ser ao longo do período histórico português sequente – Ditadura Militar e Estado Novo – que o paradigma se vai alterar profundamente.


O voto é concedido, pela primeira vez – embora com limitações – no ano de 1931, pelo decreto 19 692, de 05 de Maio:

Artigo 1.º Os vogais das juntas de freguesia são eleitos pelos cidadãos portugueses de um e de outro sexo, com responsabilidade de chefes de família, domiciliados na freguesia há mais de seis meses. § 1.º Têm responsabilidade de chefes de família para os efeitos do corpo deste artigo:

1.º Os cidadãos portugueses do sexo masculino com família constituída, se não tiverem comunhão de mesa e habitação com a família dos seus parentes até o terceiro grau da linha recta colateral, por consanguinidade ou afinidade; 

2.º As mulheres portuguesas, viúvas, divorciadas ou judicialmente separadas de pessoas e bens com família própria e as casadas cujos maridos estejam ausentes nas colónias ou no estrangeiro, umas e outras se não estiverem abrangidas na última parte do número anterior. (…) 
Art. 2.º Os vogais das câmaras municipais são eleitos na proporção a estabelecer no Código Eleitoral: (…) 5.º Pelos cidadãos portugueses do sexo feminino, maiores de vinte e um anos, com curso secundário ou superior comprovado pelo diploma respectivo, domiciliados no concelho há mais de seis meses.

O decreto n.º 23 406, de 27 de Dezembro de 1933 acrescenta a possibilidade de voto à mulher solteira, maior ou emancipada, quando de reconhecida idoneidade moral, que viva inteiramente sobre si e tenha a seu cargo ascendentes, descendentes ou colaterais.

No ano de 1946 este direito vem a ser estendido às eleições legislativas e presidenciais pela publicação da Lei n.º 2 015, de 28 de Maio. Apesar de tudo as condicionantes ainda são muito restritivas:

Artigo 1.º São eleitores do Presidente da República e da Assembleia Nacional: 

1.º Os cidadãos portugueses do sexo masculino, maiores ou emancipados, que saibam ler e escrever português;
2.º Os cidadãos portugueses do sexo masculino, maiores ou emancipados, que, embora não saibam ler e escrever, paguem ao Estado e corpos administrativos quantia não inferior a 100$, por algum ou alguns dos seguintes impostos: contribuição predial, contribuição industrial, imposto profissional e imposto sobre aplicação de capitais; 
3.º Os cidadãos portugueses do sexo feminino, maiores ou emancipados, com as seguintes habilitações mínimas: a) Curso geral dos liceus; b) Curso do magistério primário; c) Curso das escolas de belas-artes; d) Cursos do Conservatório Nacional ou do Conservatório de Música do Porto; e) Cursos dos institutos industriais e comerciais.
4.º Os cidadãos portugueses do sexo feminino, maiores ou emancipados, que, sendo chefes de família, estejam nas demais condições fixadas nos n.ºs 1.º ou 2.º; 
5.º Os cidadãos portugueses do sexo feminino que, sendo casados, saibam ler e escrever português e paguem de contribuição predial, por bens próprios ou comuns, quantia não inferior a 200$.

No dia 26 de Dezembro de 1968 é publicada a Lei n.º 2137, que vem finalmente remover qualquer discriminação em função do sexo. O diploma legal não faz a distinção entre “cidadãos portugueses do sexo masculino” e “cidadãos portugueses do sexo feminino”. Do voto são apenas excluídos os cidadãos que não saibam ler e escrever e nunca tenham sido recenseados ao abrigo da Lei n.º 2015, de 28 de Maio de 1946:

Base I – São eleitores da Assembleia Nacional todos os cidadãos portugueses, maiores ou emancipados, que saibam ler e escrever e não estejam abrangidos por qualquer das incapacidades previstas na lei; e os que, embora não saibam ler nem escrever português, tenham já sido alguma vez recenseados ao abrigo da Lei n.º 2015, de 28 de Maio de 1946, desde que satisfaçam aos requisitos nela fixados.

Após o golpe de Estado de 25 de Abril de 1974 assistimos a uma alteração política e social. No dia 14 de Maio desse ano é publicada a Lei n.º 621-A/74. O art. 1.º, com a epígrafe “capacidade eleitoral activa”, preceituava o seguinte: São eleitores da Assembleia Constituinte os cidadãos portugueses de ambos os sexos, maiores de 18 anos, completados até 28 de Fevereiro de 1975, residentes no território eleitoral ou nos territórios ultramarinos ainda sob administração portuguesa, assim como os aí não residentes indicados no presente diploma.

Em abono da verdade, o diploma não oferecia qualquer novidade no que concerne ao voto das mulheres, quando comparada com a Lei n.º 2137, de 26 de Dezembro de 1968: o diploma circunscrevia-se à eleição para a Assembleia Constituinte.

No dia 2 de Abril de 1976 foi publicada a nova Constituição da República Portuguesa. O n.º 2, do art. 48.º prescrevia que O sufrágio é universal, igual e secreto e reconhecido a todos os cidadãos maiores de 18 anos, ressalvadas as incapacidades da lei geral, e o seu exercício é pessoal e constitui um dever cívico. Este preceito teve expressão na Lei n.º 69/78, de 3 de Novembro (Lei de Recenseamento Eleitoral). O art. 1.º dispunha o seguinte: O recenseamento eleitoral é oficioso, obrigatório e único para todas as eleições por sufrágio directo e universal.

Com a entrada em vigor deste diploma legal, ficou finalmente eliminada toda e qualquer discriminação, já que o âmbito de aplicação englobava, não só o sufrágio para a Assembleia da República, como para todas as eleições, inclusive para os órgãos das autarquias locais.

O voto feminino no Brasil
A luta mundial dos movimentos feministas inclui em seus registros o nome da cidade de Mossoró, no estado do Rio Grande do Norte. Em 1928, esse estado nordestino era governado por Juvenal Lamartine, a quem coube o pioneirismo de autorizar o voto da mulher em eleições, o que não era permitido no Brasil, mesmo a proibição não constando da Constituição Federal. A Inglaterra alguns meses depois regularizou o voto feminino no mesmo ano.

No Consultor Jurídico do jornal “O Estado de São Paulo”, encontra-se a informação de que logo após a proclamação da República, o governo provisório convocou eleições para uma Assembléia Constituinte. Na ocasião, uma mulher conseguiu o alistamento eleitoral invocando a legislação imperial, a “Lei Saraiva”, promulgada em 1881, que determinava direito de voto a qualquer cidadão que tivesse uma renda mínima de 2 mil réis. Mas a primeira eleitora do país foi a potiguar Celina Guimarães Viana, que invocou o artigo 17 da lei eleitoral do Rio Grande do Norte, de 1926: 

“No Rio Grande do Norte, poderão votar e ser votados, sem distinção de sexos, todos os cidadãos que reunirem as condições exigidas por lei”. Em 25 de novembro de 1927 ela deu entrada numa petição requerendo sua inclusão no rol de eleitores do município. O juiz Israel Ferreira Nunes deu parecer favorável e enviou telegrama ao presidente do Senado Federal, pedindo em nome da mulher brasileira, a aprovação do projeto que instituía o voto feminino, amparando seus direitos políticos reconhecidos na Constituição Federal”.

Após Celina Guimarães Viana ter conseguido seu título eleitoral, um grande movimento nacional levou mulheres de diversas cidades do Rio Grande do Norte, e de mais outros nove estados da Federação, a fazerem a mesma coisa.

Cumpre citar igualmente o pioneirismo da estudante de direito mineira, Mietta Santiago (pseudônimo de Maria Ernestina Carneiro Santiago Manso Pereira). Mineira educada na Europa, com 20 anos retornou do velho mundo e descobriu, em 1928, que o veto ao voto das mulheres contrariava o artigo 70 da Constituição Brasileira de 24 de fevereiro 1891, então em vigor. Com garantia de sentença judicial (fato inédito no país), proferida em Mandado de Segurança, conquistou o direito de votar. O que de fato fez, votando em si mesma para uma vaga de deputada federal. Carlos Drummond de Andrade, impressionado com a conquista do voto feminino, dedicou a Mietta o poema 

“Mulher Eleitora”:
Cquote1.svg
Mietta Santiago
loura poeta bacharel
Conquista, por sentença de Juiz,
direito de votar e ser votada
para vereador, deputado, senador,
e até Presidente da República,
Mulher votando?
Mulher, quem sabe, Chefe da Nação?
O escândalo abafa a Mantiqueira,
faz tremerem os trilhos da Central
e acende no Bairro dos Funcionários,
melhor: na cidade inteira funcionária,
a suspeita de que Minas endoidece,
já endoideceu: o mundo acaba”.
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A “Revista Feminina” de São Paulo, julho de 1926, número 146, ano XIII, traz sob o título ‘Poetisas mineiras da moderna geração’ um registro do episódio, redigido por Djalma Andrade: “Mietta Santiago… …defendido teses arrojadas de Direito Constitucional. É feminista. Há tempos, raiou brilhantemente o direito de voto às mulheres”.

Com a mulher eleitora, vieram outras conquistas de espaço na sociedade. Veio a primeira mulher a eleger-se deputada estadual no Brasil, e a luta pela emancipação feminina foi ganhando impulso em todo o país, levando o voto feminino a ser regulamentado em 1934 no governo Vargas. O episódio tem importância mundial, pois mais de uma centena de países ainda não permitia à mulher o direito de voto.

Os primeiros exemplos de organização de mulheres nos vieram das regiões norte e nordeste, no final do século XIX, e eram voltados para a causa abolicionista. Nascida no Ceará, em 1882, a “Sociedade das Senhoras Libertadoras ou Cearenses Libertadoras”, presidida por Maria Tomásia Figueira, em parceria com Maria Correia do Amaral e Elvira Pinho, atuou em defesa da liberdade fundando associações em Fortaleza e no interior do estado, contribuindo para que, em 1884, a Assembléia Legislativa provincial, finalmente, decretasse o fim da escravidão no Ceará. Nesse mesmo ano, foi criada, na cidade de Manaus, a associação “Amazonenses Libertadoras”, fundada por Elisa de Faria Souto, Olímpia Fonseca, Filomena Amorim, entre outras – todas brancas e representantes da elite local. Contudo, elas defendiam a emancipação de todos os escravos do solo amazonense, o que aconteceu, em 30 de março de 1887, um ano antes da Lei Áurea.

Em 1910 Leolinda Daltro e outras feministas, entre elas a escritora Gilka Machado, fundaram, na então capital federal, o Partido Republicano Feminino, cujo objetivo era “promover a cooperação entre as mulheres na defesa de causas que fomentassem o progresso do país”. O objetivo maior da agremiação era a luta pelo sufrágio feminino, uma vez que as mulheres não podiam votar e nem ser votadas. Esse grupo de feministas adotou uma linguagem política de exposição pessoal diante de críticas da sociedade, realizando manifestações públicas que não foram tratadas com indiferença pela imprensa e os leitores. O Partido Republicano Feminista teve o mérito inegável de lançar, no debate público, o pleito das mulheres pela ampla cidadania.

Em 1917, a agitação social das greves operárias, o movimento anarquista, o fim da primeira guerra mundial, e a maior escolaridade de mulheres da elite, trouxeram à tona uma outra geração de feministas. No ano de 1920, surgiram vários grupos intitulados Ligas para o Progresso Feminino, embrião da poderosa Federação Brasileira pelo Progresso Feminino. Fundada em 1922 e dirigida por Bertha Lutz, a Federação teve papel fundamental na conquista do sufrágio feminino e, por extensão, na luta pelos direitos políticos da mulher, e destacou-se, também, como organização feminista com maior inserção nas esferas de poder da época. Suas militantes escreveram na imprensa, organizaram congressos, articularam com políticos, lançaram candidaturas, distribuíram panfletos em aviões, representaram o Brasil no exterior.

Laura Brandão e Maria Lopes integravam o “Comitê das Mulheres Trabalhadoras”, fazendo propaganda em porta de fábricas e tentando aproximar o operariado feminino e o Partido Comunista Brasileiro. A sufragista gaúcha Natércia da Silveira, dissidente da “Federação Brasileira pelo Progresso Feminino”, fundou em 1931 a “Aliança Nacional de Mulheres”, para prestar assistência jurídica à mulher. Com 3 mil filiadas, a Aliança foi fechada pelo golpe de 1937, que aboliu as liberdades democráticas e abortou as organizações políticas e sociais do país.

No plano nacional, o Presidente Getúlio Vargas resolve simplificar e todas as restrições às mulheres são suprimidas. Através do Decreto nº. 21.076, de 24 de fevereiro de 1932, é instituído o Código Eleitoral Brasileiro, e o artigo 2 disciplinava que era eleitor o cidadão maior de 21 anos, sem distinção de sexo, alistado na forma do código. É de ressaltar que as disposições transitórias, no artigo 121, dispunham que os homens com mais de 60 anos e as mulheres em qualquer idade podiam se isentar de qualquer obrigação ou serviço de natureza eleitoral. Logo, não havia obrigatoriedade do voto feminino.

sexta-feira, 2 de maio de 2014

1° de Maio de 2014 – FAAF no Jardim Itaqui


Nos importa muito lembrar que as mulheres pobres e lutadoras pela emancipação da classe explorada, foram protagonistas na conquista, entre tantos exemplos, dos direitos de tentar garantir o sustento de sua casa ao invés de se submeter às vontades e sustento do marido; o direito ao divórcio ao invés de suportar um esposo inconveniente, como suas avós faziam; o direito de tomar a iniciativa para conquistar seus namorados ao invés de esperar que o homem lhe viesse a cortejar; estudar as ciências, artes, política, ao invés de se limitar a ser boa esposa e fértil.

Grandes homens estiveram juntamente com as bravas guerreiras semeando o feminismo que os liberta para não serem os provedores da casa, e que os permitem serem fracos, chorões, empetecados, tímidos, pacíficos, sensíveis, amorosos…

Tais direitos são chamados de conquistas pois nós só os temos através da luta popular e feminista radical. Há muitas reivindicações a serem feitas, a partir principalmente dos clubes de mães, coletivos, grêmios estudantis e associações de bairro. Há muitas conquistas por vir.

Precisamos ainda de oportunidades para nos desenvolvermos nos estudos e nas profissões e onde mais nos interessar. Garantir direitos, ao divórcio, à integridade, ao nosso corpo, para inclusive, decidir quando seremos mães, podendo assim interromper a gestação com segurança quando desejado, continuam a ser nossas bandeiras históricas. Decidir quais relações sexuais queremos ter, quais identidades queremos desempenhar, independente do sexo com que nascemos, e não sermos violentadxs por sermos gays, trans, promíscuas, pobres, ou apenas por tornar-se mulheres ou homens.

Se tivemos conquistas no direito trabalhista e no setor feminista, é porque antes de mais nada, mulheres, homens, jovens, anciãns e anciãos, deram-se as mãos formando a corrente de resistência contra o verdadeiro agressor e vândalo diário de nossas vidas, chamado Estado Patriarcal Totaliário Mercantil.
Unidas todos, festejemos a vitória sob nossa bandeira negra e roxa que representa a luta comum feminista!


Viva o 1° de Maio! Viva a luta das trabalhadoras!!

sexta-feira, 7 de março de 2014

8 DE MARÇO: DIA DE MEMÓRIA E LUTA


A idéia da existência de um dia internacional da mulher surge na virada do século XX, período da Segunda Revolução Industrial e da Primeira Guerra Mundial, quando ocorre a incorporação da mão-de-obra feminina, em massa, na indústria. As condições de trabalho, frequentemente insalubres e perigosas, eram motivos de frequentes protestos por parte dos trabalhadores. Muitas destas ocorreram nos anos seguintes, em várias partes do mundo, destacando-se Nova Iorque, Berlim, Viena (1911) e São Petersburgo (1913).

O primeiro Dia Internacional da Mulher foi consolidado em 28 de fevereiro de 1909 nos Estados Unidos, por iniciativa do Partido Socialista da América, em memória do protesto contra as más condições de trabalho das operárias da indústria do vestuário de Nova York.

No ano seguinte, o Dia Internacional da Mulher foi celebrado em 19 de março, por mais de um milhão de pessoas. Em 25 de março de 1911, um incêndio na fábrica da Triangle Shirtwaist matou 146 trabalhadoras - a maioria costureiras. O número elevado de mortes foi atribuído às más condições de segurança do edifício. Este fato tornou-se um marco histórico na luta das mulheres.

O dia 8 de março é o dia internacional da mulher proletária e não de todas as mulheres, sua definição demonstra uma posição de classe. O feminismo burguês tenta colocar este dia como conciliação de classes, falam que hoje a mulher independente de sua classe social conquistou sua liberdade e seu espaço. Mas de que liberdade e espaço estão falando? E para quem? Para a maioria das mulheres, a situação de vida continua sendo cada vez de maior opressão, miséria e exploração, junto da maioria que compõem sua classe, a dos pobres, proletários, operários e camponeses.

domingo, 16 de fevereiro de 2014

Nota de Pesar à Santiago Andrade


Nós da FAAF, subscrevemos junto à outras organizações em solidariedade ao câmera morto nos últimos conflitos pela luta pelo fim do transporte mercantilista. Entendemos que, assim como a luta pelo espaço das mulheres na sociedade como um todo, vítimas do Estado não tem genero, mas classe.
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Lamentamos muito pela morte de Santiago Andrade e por todas as outras vítimas do Estado totalitário mercantil.

Santiago era CÂMERA e não "cinegrafista" como romantiza agora a grande mídia. Ele sempre foi aquele operário invisível que produzia calado e que muitos sequer sabiam que existia. Santiago era a base de uma pirâmide hierárquica cujo topo concentra os beneficiários dos grandes blocos de comunicação do Brasil.

A meio caminho do topo desta pirâmide, um exército de repórteres precariamente remunerados precisa falar, escrever, reportar e pesquisar de forma a atender os anseios dos donos da comunicação. Para subir um degrau nesta pirâmide é preciso cuidado na fala. Trata-se de uma censura tácita que abala a credibilidade da imprensa, onde já não é mais possível distinguir a notícia real da propaganda estatal e mega-corporativa. Enfim, o corpo inerte de Santiago será usado para beneficiar exatamente os mesmos de sempre - os concentradores de informação, de renda e de poder - e a culpa será do povo, de novo...

Diante ao terrorismo do Estado Totalitário brasileiro pela falaciosa “ordem”, onde mega-corporações ditam a democracia, nós, trabalhadores servis, desempregados e solidários à classe explorada, que geramos riquezas para o país sem receber minimamente o que nos é direito, para além de falsas promessas dos burocratas do poder, não ganhamos mais que violência física e moral, cotidianamente, e vítimas brutais, como Santiago Andrade!

Assim, entendemos que o principal responsável por este acidente é o próprio Estado que nos força a deixar nossas casas e exigir nossos direitos nas ruas, e nelas enfrentar a truculência deste Estado personalizado na força policial, na qual não deveriam jamais usar armas contra a população e assim a população não precisaria reagir contra ela.

Não suportaremos mais viver nessa “terra-de-alguém”. Onde alguém rico, por de trás de instituições, gestione contra a população. Concentração de renda, carestia, precariedade nos serviços públicos, gás lacrimogênio, balas de borracha, espancamentos, prisões arbitrárias, júris comprados, mídia tendenciosa e ainda a inversão do mérito, como se nós fôssemos os assassinos premeditados.

De um lado temos populares com materiais artesanais, com pouca ou nenhuma técnica e aprimoramento, e de outro lado, velhacos oficialmente armados com material bélico, cientes do efeito das suas armas sobre a população marginalizada.

Deixemos bem claro a quem deseja nos criminalizar: a rua não se calará!

* Em solidariedade *

- Amarildo Dias de Souza – Desaparecido entre os dias 13 e 14 de julho de 2013, após a operação batizada de Paz Armada que mobilizou 300 policiais na Rocinha, RJ. http://pt.wikipedia.org/wiki/Caso_Amarildo


- Giuliana Vallone, de 18 anos espancada por policiais e logo após atropelada por uma motocicleta da polícia em 25/01/14, após a manifestação realizada na região central de São Paulo http://videos.r7.com/jovem-e-atropelada-e-agredida-por-policiais-em- sp/idmedia/52e8c7ea0cf2401273d29912.html



- Fabrício Proteus Nunes Fonseca Mendonça Chaves, de 22 anos, a ser ferido por dois disparos feitos por policiais militares, durante o protesto contra a Copa do Mundo que aconteceu no sábado 25/02/14. Ele foi internado em coma induzido.

http://noticias.r7.com/sao-paulo/versao-da-policia-esta-estranha-diz-advogado-sobre-caso-de-manifestante-baleado-em-sp-27012014

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MPL- Curitiba, autônomo e independente

MPL- Núcleo Biblioteca Publica de Curitiba

CMI - Centro de Mídia Independente Curitiba

NAC - Núcleo Anarquista de Curitiba

Ocupação 13 de Janeiro

Associação de bairro Jardim Itaqui

FAAF - Frente de Ação Anarca Feminista

GERAE – Grupo de experiência rural agroecológica

Biblioteca Maria Lacerda de Moura




sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

O dia 6 de fevereiro, Dia Internacional de Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina









Até 86 milhões de meninas poderão sofrer com mutilação genital 
feminina até 2030, alerta ONU

Aprovando com unanimidade na Assembleia Geral da ONU,
é lembrado nesta quinta-feira (6) o Dia Internacional de
Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina. Para
marcar a data, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon,
afirmou que “não há nenhuma razão religiosa, de saúde ou
de desenvolvimento para mutilar ou cortar qualquer menina
ou mulher”.

“Embora alguns argumentem que é uma “tradição”, devemos
lembrar que a escravidão, as mortes por honra e outras
práticas desumanas foram defendidas com o mesmo argumento”,
afirmou Ban.

Segundo o chefe da ONU, a data é uma oportunidade para
enfrentar este problema persistente, bem como para encontrar
esperança em iniciativas que provam que se pode acabar com a
esta prática.

“Apenas porque uma prática dolorosa existe há muito tempo
não justifica sua continuação. Todas as “tradições” que rebaixam,

 humilham e ferem são violações dos direitos humanos que
devem ser ativamente combatidas até que acabem”, lembrou ele.

A prática está caindo em desuso em quase todos os países,
mas ainda está assustadoramente espalhada pelo mundo,
informou a Organização. Embora dados estatísticos seguros
sejam difíceis de obter, estima-se que mais de 125 milhões
de meninas e mulheres tenham sido mutiladas em 29 países
na África e no Oriente Médio, onde a prática prevalece e
onde há dados disponíveis.

Se as tendências atuais persistirem, cerca de 86 milhões de
meninas em todo o mundo estão sujeitas a sofrer a prática
até 2030. “Ásia, Europa, América do Norte e outras regiões
não são poupadas e devem estar igualmente vigilantes
para com este problema”, destacou Ban.

O secretário-geral se demonstrou esperançoso quanto ao problema,
lembrando que recentemente, Uganda, Quênia e Guiné-Bissau
adotaram leis para pôr fim à prática. “Na Etiópia os responsáveis
foram presos, julgados e penalizados com ampla cobertura
da imprensa, conscientizando dessa forma o público”, destacou.

Mensagem do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, 
para o Dia Internacional de Tolerância Zero à 
Mutilação Genital Feminina, lembrada no dia 6 de fevereiro.

“Como secretário-geral das Nações Unidas levanto bem alto
a bandeira do empoderamento das mulheres e meninas,
promovendo sua saúde e defendendo seus direitos.

O Dia Internacional de Tolerância Zero à Mutilação
Genital Feminina é uma oportunidade para enfrentar
este problema persistente, e para encontrar esperança em
iniciativas que provam que se pode acabar com a esta prática.
Devemos lutar para preservar o melhor de cada cultura e deixar
para trás o que não é bom.

Não há nenhuma razão religiosa, de saúde ou de desenvolvimento
para mutilar ou cortar qualquer menina ou mulher.
Embora alguns argumentem que é uma “tradição”, devemos
lembrar que a escravidão, as mortes por honra e outras práticas
desumanas foram defendidas com o mesmo argumento.
Apenas porque uma prática dolorosa existe há muito tempo não
justifica sua continuação. Todas as “tradições” que rebaixam,
humilham e ferem são violações dos direitos humanos
que devem ser ativamente combatidas até que acabem.

A mutilação genital feminina causa graves danos às
vítimas. Entre as consequências na saúde, imediatas e
de longo prazo, incluem-se dor constante, infecções,
incontinência e às vezes complicações na gravidez e no parto
que podem levar à morte.

A prática está caindo em desuso em quase todos os países,
mas ainda está assustadoramente espalhada pelo mundo.
Embora dados estatísticos seguros sejam difíceis de obter,
estima-se que mais de 125 milhões de meninas e mulheres
tenham sido mutiladas em 29 países na África e no Oriente
Médio, onde a prática prevalece e onde há dados disponíveis.
Se as tendências atuais persistirem, cerca de 86 milhões de meninas
em todo o mundo estão sujeitas a sofrer a prática até 2030. Ásia,
Europa, América do Norte e outras regiões não são poupadas e
devem estar igualmente vigilantes para com este problema.

Felizmente há sinais positivos de progresso em nosso esforço
global para acabar com esta prática dolorosa.

As meninas entendem instintivamente os perigos de serem mutiladas,
e muitas mães, que viram ou experimentaram o trauma, querem
proteger suas filhas de passar pelo mesmo. É encorajador que cada
vez mais comunidades se estão se reunindo e concordando
publicamente para acabar com a mutilação genital feminina
e garantir uma vida melhor para suas meninas.

Recentemente, Uganda, Quênia e Guiné-Bissau adotaram leis
para terminar com a prática. Na Etiópia os responsáveis
foram presos, julgados e penalizados com ampla cobertura
da imprensa, conscientizando dessa forma o público.

As Nações Unidas e seus parceiros estão envolvidas
em atividades culturalmente sensíveis que visam a terminar
com a mutilação genital feminina sem censura ou vergonha.
No Sudão, estamos assistindo a uma mudança social
numa campanha chamada “Saleema”, palavra árabe que quer
dizer completo, intacto, todo e intocável. Um pai, tocado pelo
esforço, decidiu deixar suas filhas sem mutilações e explicou:
“Uma menina nasce Saleema, dessa forma deve permanecer Saleema”.

Centenas de comunidades abraçaram esta iniciativa,
expressando seu apoio através de música, poemas e roupa nas
cores brilhantes da marca da campanha. Outros países estão
reproduzindo a Saleema ou pensando soluções direcionadas
para suas necessidades locais, como o Quênia, onde os
mais velhos da comunidade Meru proibiram a prática e
prometeram penalizar quem pratique ou ajude a levar a prática a cabo.

Para além da prevenção, as Nações Unidas estão trabalhando
com parceiros para ajudar aquelas que foram afetadas pela
mutilação genital feminina.

Avanços médicos pioneiros agora permitem aos médicos
reparar os danos causados nos corpos das mulheres e
devolver-lhes sua saúde. Cito as palavras de uma médica
que trabalha em Burkina Faso que descreveu “o alívio
que oprime as mulheres” após a cirurgia, que ela afirma
ser 100% efetiva. As mulheres que não têm recursos
precisam viajar até as clínicas certas, e os programas
que oferecem o tratamento merecem apoio generoso.

A resolução histórica da Assembleia Geral, que proclamou
a celebração deste Dia Internacional, foi apoiada por todos
os países da África e abraçada por todos os membros das
Nações Unidas. Este avanço demonstra o grande valor da
ONU quando age com uma só voz para defender os
direitos humanos universais.

Nosso desafio atual é dar verdadeiro significado a este Dia,
usando-o para ganhar apoio público, criar mecanismos
práticos e legais e ajudar todas as mulheres e meninas afetadas
ou em risco de mutilação genital. O efeito será profundo, poupará
sofrimento e estimulará o sucesso. Os benefícios terão repercussões
em toda a sociedade, uma vez que estas mulheres e meninas
prosperarão e contribuirão para um futuro melhor para todos.”

Fonte: ONU

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Espanha: milhares marcham em Madri contra plano para limitar aborto


Milhares de pessoas marcharam em Madrid em protesto ao plano do governo espanhol de limitar abortos

Milhares de pessoas marcharam na capital da Espanha, no sábado, para protestar contra um plano do governo de limitar o aborto, que tem causado divisões no partido conservador governista, o Partido Popular.

Manifestantes de todo o país se juntaram à manifestação até agora contra um projeto de lei para restringir o aborto a casos de estupro ou perigo grave para a saúde da mãe.

Há quatro anos, a Espanha se alinhou com a maior parte do resto da Europa, quando o então governo socialista legalizou o aborto nas primeiras 14 semanas de gravidez.




"Este é um passo para trás. Vamos voltar 30 anos", disse Pilar Abad, 58, entre os manifestantes que marcharam da principal estação de trem até o parlamento nacional.

"Nós realmente esperamos que eles mudem essa lei durante o debate parlamentar, é por isso que estamos aqui", disse ela.

O gabinete do primeiro-ministro Mariano Rajoy aprovou o projeto de lei sobre o aborto em dezembro - em um movimento visto como tentativa de apaziguar a direita descontente do seu partido -, mas o projeto ainda não foi enviado ao Parlamento para debate.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Simone Veil, Mulher, Política e Feminista



“Tudo é mais difícil para elas, o que não pode ser aceite. Ainda existe demasiado para fazer para a igualdade em relação ao emprego, ao salário, a ascensão”.

(Simone Veil, Le journal du Dimanche, 28 Outubro 2007)Aos 80 anos a política francesa decidiu escrever uma biografia: “Uma vida”. Simone Veil não teve o que se define como uma vida fácil, em Março de 1944 foi presa à Nice onde residia para ser levada com a sua família ao campo de concentração de Auschwitz. Em Janeiro de 1945 é libertada com a sua irmãs, únicas sobreviventes da sua familia.
 
Simone, lutadora, conseguiu ao longo dos anos se tornar numa das figuras políticas mais queridas de França. Não gosta de teorias para ela foi a vida que a tornou feminista. Acredita na paridade, mesmo se isso deve passar pela via de quotas. Para ela existe de facto diferenças entre o homem e a mulher, desta forma eles se complementam, mas essas diferenças não podem conduzir à superioridade do sexo masculino.
 
Na questão da contracepção livre autorizada em 1967, Simone Veil teve um papel fundamental pois foi ela que impulsionou o reembolso pela Segurança Social. No entanto foi com seu projecto, enquanto ministra da saúde, sobre a Liberalização do Aborto em 1974 que ganhou mais reconhecimento. O projecto votado em Assembleia foi um dos que suscitou mais reacções negativas.
 
No seu livro, “Os homens também se recordam”, Simone Veil explica o seu projecto de lei e como foi debatido na Assembleia. “Os vários discursos e os debates que sucederam em França revelaram-na ao país como uma mulher corajosa e determinada que lutou pela dignidade das mulheres como também pelo interesse da Nação, perante políticos hostis mesmo do seu próprio partido”.
 
Sylvie Oliveira
SylvieO6@hotmail.co

sábado, 4 de janeiro de 2014

O Segundo Sexo - 1949




O Segundo Sexo , de Simone de Beauvoir, é sem dúvida alguma uma das principais obras de referência nos estudos sobre mulher e relações de gênero. Publicado originalmente na França, em 1949, quando a Europa ainda se recuperava das feridas abertas pela Segunda Guerra Mundial, o livro é um amplo tratado sobre a “questão da mulher” na perspectiva existencialista. Apresentado em dois volumes, faz a crítica, no primeiro, ao determinismo biológico, às abordagens psicologizantes e ao materialismo histórico, argumentando que mulher é uma construção social, historicamente determinada, construída no pensamento ocidental como “o outro”. Iniciado com a famosa frase, “não se nasce mulher, torna-se mulher”, o segundo volume analisa como se dá esse “tornar-se” na França do pós-guerra, e como se manifesta a subordinação da mulher nesse contexto.

Note-se, porém, que em O Segundo Sexo Simone de Beauvoir não poupa críticas sequer às feministas da época. Mas não hesitou em declarar-se “feminista” na década de 70, até “feminista radical”, como referiu em entrevista ao LeMonde:

“eu sempre disse que era feminista na medida em que feminismo, para mim, significa que eu reclamo uma identidade de situação entre o homem e a mulher, e de igualdade radical entre o homem e a mulher”.

Engajando-se avidamente no Movimento de Libertação da Mulher da França, assinou, inclusive, o manifesto em favor do aborto que causou grande controvérsia nos meios acadêmicos franceses.
Já em O Segundo Sexo, Simone aborda questões bastante polêmicas ainda hoje, a exemplo da desconstrução do “mito da maternidade” como destino feminino. Nessa perspectiva, Simone de Beauvoir contrapõe-se à antropóloga americana Margaret Mead, cuja obra, Macho e Fêmea, da mesma época, faz o “elogio da maternidade”, com base numa perspectiva liberal, culturalista.

Não foi, então, por acaso que O Segundo Sexo teve maior impacto, sendo traduzido para mais de 30 idiomas e publicado em vários países, constituindo-se, ainda hoje, em alvo de críticas e fonte de reflexão e inspiração feministas por todo o mundo.
De fato, apesar de ser escrito para a geração de mulheres que vivenciou a Segunda Grande Guerra, O Segundo Sexo fala também às gerações posteriores, mantendo-se bastante atual em grande parte de suas considerações e análises. Isso não implica em dizer que, nessas últimas cinco décadas, o pensamento feminista não tenha avançado significativamente. Ao contrário, desde a retomada do Movimento nos anos 60 e, mais particularmente, a partir de meados dos anos 80, novas formas feministas de pensar e analisar as relações de gênero e a condição feminina têm tido lugar.

Em O Segundo Sexo, não poderia ser diferente, Simone foi abundante e múltipla: nas formas de expressão escrita – filosofia, literatura de ficção (romances, contos), ensaios, manifestos políticos, memórias; nas temáticas – em que o ser mulher e ter uma idade permeia trajetórias ou tangencia essa produção toda; e até, enquanto esteve viva, nos seus exemplos pessoais, no reflexo das representações do seu “eu” vanguardista no nosso quotidiano.
Os trabalhos, aqui, diretamente sobre O Segundo Sexo e/ou outras produções de Simone de Beauvoir, que constituem a Parte I deste livro, ecoam essa multiplicidade exatamente na diversidade de enfoques: vão do paradigma filosófico subjacente às suas práticas de vida e de expressão teórico-ética ao confronto com as teorias e a crítica feministas (na conferência de Heleieth Saffioti e no texto de Raimunda Bedasee), às comparações possíveis e diretas com outras escritoras, sua contemporânea Margaret Mead e nossa contemporânea Camille Paglia, passa pelo debate específico sobre a dupla questão radical do aborto e da violência doméstica até interpelar, ainda, a mestra sobre questões de gênero e idade e despedir-se  com carinho.
Valendo registrarem-se, ainda, as diferenças de expressão e “temperatura” afetiva e geracional nas referências das diferentes autoras: algumas a “Simone”, outras a “De Beauvoir”...

Leia em PDF "O Segundo Sexo"